sábado, 5 de março de 2011

"Se não for como eu quero, não será..."


Um problema, relativamente sutil, e que é recorrente na vida de pessoas espirituais - ou que se pretendem tais - é o sempre e onipresente apego às próprias preferências, ao próprio modo, aos próprios desejos. São incapazes de aceitar uma novidade; não permitem surpresas; não se permitem submeter a ninguém; rejeitam tudo quanto não se insira, desde já, nos estreitos limites de sua previsão. Mesmo Deus, que é, por definição, infinito, não tem liberdade, para um cristão assim, de corresponder a esta sua ilimitação, pois, uma vez que Ele - Deus - extrapola facilmente a fraca previsão humana, será recusado como uma ameaça.

Acontece que isto é bastante sério. No fundo desta atitude, reside o grande inimigo do homem: o amor próprio. Este amor próprio, que o Thomas Merton define muito bem como sendo o inferno, é o que faz que estas pessoas vivam em guerra em dois sentidos: 1) para garantir e agarrar o que, segundo seu modesto ponto de vista, é-lhes importante. 2) para fugir das imprevisibilidades, numa tentativa de evadir-se de possíveis riscos. E, de uma forma bem mais clara, o que se busca aí não é nada além do conforto da vontade.

É precisamente neste contexto que a cruz surge como uma mensagem de profunda liberdade, porque ela corta esta mediocridade humana e exige daquele que se dispõe a seguir Nosso Senhor que transcenda os próprios cuidados, tão baixos e tão fúteis.

É importante, sobretudo, reconhecer em nós mesmos estas tendências. Estamos sempre à procura de situações ideais -  isto é, segundo os nossos critérios. E se Deus nos pede que abramos mão deles para que possamos experimentar, uma vez apenas, um pouco da bondade de Deus, ficamos receosos, porque não confiamos em Deus e não confiamos porque não O amamos.

E depois de tudo isto, ainda pretendemos ser espirituais.. rs... Ironia de cegos!

Acontece que esta rebeldia, este egocentrismo, não obstante seja, em última análise, uma tentativa de se auto-garantir a alegria, é, na verdade, o maior impedimento para a verdadeira alegria, uma alegria que só Deus pode dar.

Se agimos assim, caríssimos, não somos espirituais nem aqui nem na China. Precisamos, como dizia S. Paulo, ainda dos primeiros rudimentos da Fé e do mais ralinho leite espiritual, porque sequer deixamos de ser carnais e é o egoísmo que ainda prevalece. Triste...

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