quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Quando o que se quer fazer, não obstante seja correto, desagrada um outro

Há vezes em que travamos o nosso passo por uma certa prudência. Certas atitudes, por mínimas que sejam no seu ato, trazem algumas repercussões que, à semelhança das ondas de um lago motivadas pelo cair de um objeto, espalham-se com facilidade. Isto se dá porque nós, como já dizia Aristóteles, somos seres que vivem em sociedade. No entanto, essa sociedade não é apenas um amontoado de corpos físicos, mas um conjunto de almas que guardam, também, uma comunhão afetiva e espiritual. Estas repercussões de que falávamos podem ser agradáveis ou desagradáveis e, imediatamente, tendemos a associar o agradável com o bem e o desagradável com o mal. Mas esta é uma associação forçada. Pode ser que isto se dê; pode ser que não.

A experiência cotidiana nos mostrará que, em alguns casos, será virtuoso abster-se de certas decisões em vistas do bem de um outro. No entanto, há que se notar se aquilo se trata mesmo de um bem. Como somos muito voltados ao respeito humano e usamos de critérios não raro superficiais, esta confusão se torna um tanto freqüente. Há que se cuidar, também, para que a ação em questão não seja má ou motivada por más intenções. E para tal, é necessário ter uma certa clareza.

Acontece, porém, de a referida ação que se quer tomar ser algo de objetivamente bom e, não obstante, haver qualquer receio de um certo mal estar alheio. Nestas situações, avaliado o contexto, não é necessário impedir-se de ir adiante. Todos temos experimentado, ao longo da vida, certas tristezas e decepções. Elas são inevitáveis e, à sombra da Cruz, tornam-se via para maturação e santificação. Também Nosso Senhor afirmou ter vindo trazer a espada da separação e que, algumas vezes, isto traria tensões entre os filhos e os pais, etc. As ações que causam tais sofrimentos não devem ser identificadas com o mal, mas são passos que devem ser dados. Por vezes, recebemos a solicitação de uma certa situação que é justa e que, uma vez que se lhe corresponda, causará talvez alguma decepção ao nosso redor. O renunciar a si mesmo pelo outro não é um bem a priori. Isso deve ser praticado em vistas do contexto, a posteriori. Devemos fazê-lo sempre com Deus pelo fato de que Deus sempre quer o Bem e nunca se engana. Mas isto não procede com outras situações.

Há casos em que privar alguém de um dado sofrimento seria provocar-lhe um mal, ainda que este outro não o percebesse. Daí, notamos como isto é algo de objetivo, e não subjetivo; que transcende as interpretações dos sujeitos envolvidos. São situações objetivas às quais é preciso agir objetivamente, com a objetividade da cruz. O respeito humano, ao contrário, é o que privilegia o subjetivo do outro sobre o seu bem objetivo. Haverá, portanto, dias em que agir de um determinado modo será necessário, ainda que isto, a princípio, venha a causar algum sofrimento. Fazê-lo não significará desrespeito pelo outro, pelos seus sentimentos; muito pelo contrário. Será meio de fazer-lhe crescer e atentar para outras coisas. Será como uma libertação iniciada por uma certa dor à qual, especificamente, não convirá impedir. É como um parto: da dor surgirá uma vida.

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